10 de abr. de 2010

"Fantasma da fome volta a assombrar a África"

 "Levantamento de ONGs mostra que quase 46% das crianças de região sudanesa estão desnutridas

As imagens de crianças esqueléticas indicam a iminência de uma tragédia em um vilarejo de cabanas de palha no Sudão, próximo à fronteira com a Etiópia. É o lugar onde há maior escassez de alimentos em todo o mundo, de acordo com as Nações Unidas. Dois anos de secas, a consequente fome e confrontos tribais em Akobo e arredores prenunciam uma nova crise humanitária no continente africano.
O Programa Mundial de Alimentos quadruplicou sua assistência de janeiro a março e passou a alimentar 80 mil pessoas na área. Mesmo assim, crianças com braços esquálidos, costelas protuberantes e estômagos inchados enchiam na quinta-feira passada a sala de um hospital, enquanto anciões que vivem nos entornos de Akobo se resguardavam à sombra, sem forças para caminhar.
As agências internacionais de ajuda se preparam para o pior. Mesmo se as chuvas da primavera (no Hemisfério Norte) se confirmarem, a colheita não chegará até o outono. A seca é especialmente preocupante porque a maior parte da população vive da agricultura.
E, se não chover, a situação se agravará – disse Galiek Galou, um dos três médicos do hospital da localidade.
Além disso, mesmo se os moradores tivessem dinheiro, estariam em dificuldade, porque não há o que comprar, afirma Galou. Em uma das salas do hospital, umas 10 crianças permanecem quase imóveis, com os rostos abatidos e ossos que parecem esticar a pele. As organizações internacionais Save the Children e Medair procuraram os que estão mais mal alimentados e encontraram 253 em situação de severa desnutrição, isto é, morreriam sem uma ajuda imediata. Eles são alimentados com manteiga de amendoim reforçada com outros nutrientes.

Situação está muito além do nível de emergência

Uma pesquisa recente de ambas as ONGs indicou que quase 46% das crianças da região estão desnutridas. Lise Grande, a mais alta funcionária das Nações Unidas no sul do Sudão, afirmou que a maioria das organizações humanitárias já consideram um percentual de 15% como uma situação emergencial.
Este ano, 4,3 milhões de pessoas no sul do Sudão vão necessitar de algum tipo de assistência alimentar. Quando um país tem tanta gente necessitada de alimentos, se pode avaliar a magnitude da crise que temos de enfrentar aqui – aponta Lise.
Localizada no sudeste sudanês, Akobo se situa em uma região isolada, palco de conflitos tribais que provocaram o deslocamento de quase 400 mil pessoas. A crise alimentar também é um legado de uma devastadora guerra civil de 21 anos que deixou milhões de mortos. O conflito não está ligado aos combates na região de Darfur, no oeste do Sudão, que causaram 300 mil mortos e 2,7 milhões de refugiados desde seu início, em 2003".

Problema antigo
Infelizmente, a situação enfrentada no Sudão não é a primeira crise humanitária no país ou na África:
- A República Democrática do Congo, na região central da África, era palco em 2008 de uma crise humanitária que obrigou 1 milhão de pessoas a deixar suas casas. Motivo: combates entre rebeldes, milícias e tropas do governo.
- Em 1984, uma grave crise atingiu a Etiópia, quando a fome matou cerca de 1 milhão de habitantes. Em 2008, o problema ressurgiu devido a uma nova seca – a maioria dos etíopes vive da agricultura.

Notícia e imagem publicada em  Zero Hora,  10 de abril de 2010 | N° 16301